viernes, julio 25, 2008

outra

sem perceber, desenvolveu em si a mania
de listar coisas que lembrassem passantes seus
Pensava em Derby, Glória, Engenho de Dentro, Los Hermanos, Prime, Argentina, Cocaína, Urca, Pijama, Gengiva, Cabelo curto, Barba, Cicatriz, Beatles, Juana Molina.

Quando sentia um esforço da lembrança é porque não era natural.
As memórias existem antes pelo sentimento.

pedido de aniversario

abriria mão de tudo para ser um livro.
sem dedicatória, apenas com as páginas mordidas, livro lido, guardado.

ontem mesmo

Era jea um dia que passou. E eu logo vi que fazia coisas da minha infância. As recriava, assim, como espelho.
Só que agora minha pele não é mais tão lisa, marcaram-se as noites.
E minha barriga, pernas braços, já não são os mesmos.
Não alcanço mais as minhas extremidades.
Envelheço e me condenso cada vez mais.
Da gravidade do tempo.

viernes, julio 18, 2008

istimos

Encontraram a tua mandíbula ontem.
Era ela, vi na foto, encrustada em outros anfíbios e cavalos prehistóricos, uma metade de sua boca, os dentes curtos e afiados da sua mordida.
Antes dos oceanos terem se separado, parece que agora se entenderá algo sobre a formação das Américas. Porque você não nasceu sulamericano, ou pelo menos é do tempo em que o planeta era uma grande massa mal distribuída. Porque não era.
A sua mandíbula estava encrustada numa vertebra de um peixe mosca, dessas evoluções bizarras que apenas o passado e o mar nos guardam em vida.

sábado, julio 12, 2008

falta

Sempre soube demais o que queria e achava que a pior coisa do mundo sempre seria não ter aquilo que escolhi. É que eu sou filha única e esse sempre foi o dilema, a escolha em si como ato da construção do que sou. Porque sempre pude escolher. De fato me simplificava e ficava burra a opções e para isentar qualquer explicação, poderia inclusive ser mais fácil escolher algo que eu já sabia que não servia.
Porque eu não sei ler os sinais ou porque não quero. Porque julgo minha verdade grande demais para minha pessoa e projeto no mundo grandes respostas aas minhas perguntas.
Tudo bobagem.
É que hoje eu me emocionei vendo um filme bobo. Era uma moça que perdia o seu amante. O amante era King Kong, um macaco grande, besta, cego. Ele seguia ela da selva até a cidade e fatalmente morria rodeado de helicópteros e policiais.
Não sei bem com quem me identifiquei, apenas que chorei.

miércoles, julio 09, 2008

randolph

Passarei minha vida soletrando.
Isso já diz muito.

domingo, julio 06, 2008

amores

Isabella e Vitor se conheceram por amigos.
Ele já a conhecia de vista, de quando estudava na faculdade pareceu lembrar da cabeleira loira e cheia de Bella, que tinha muitos amigos na ECO.
Ela achava já tê-lo visto, quem sabe por Botafogo, onde suas escolas eram vizinhas por um par de quadras.
Talvez em algum dia em que ainda voltava para casa às 2 da tarde, Bella viu a Vitor saindo do recreio. Não o reconhecera.
Foram apresentados no ambiente de trabalho, faziam a mesma coisa.
Nenhum dos dois falou direito. Voltaram rápido aos seus computadores.
Sempre um bom começo para histórias de amor. Na época, ele namorava e ela se enganava.
Passou um tempo, e Bella algum dia ouviu que Vitor a achava linda.
Era fim de carnaval e ela ainda não tinha tirado a maquiagem.
Foram sujos e pintados ao Maracanã ver a final da libertadores.
Bella não gostava de futebol, Vitor sim.
Tiveram um caso tórrido, nada das promessas de início.
Ele quis cantá-la ao mundo,
mas Bella não sabia mais ser a dois.
As vezes ela anda por Botafogo e pensa como teria sido encontrar Vitor no recreio.

jueves, julio 03, 2008

Ocupo muito de mim com meu desconhecer

Principalmente a noite.
Me invade uma forte massa estranha de peso incomum, que passa e deixa rastro de leveza.
As obrigações do mundo afora estão aí, latejam.
Antes fossemos inteiros.
Mas daí o desconhecer. Isso é sempre um movimento de dentro pra fora e fora pra dentro.
Há o fora.
Sempre.
Sinto uma maré de malestar voltando.

miércoles, julio 02, 2008

palavra e corpo

Tento descrever as semelhanças daquilo que não sei dar nome,
para que palpável volte a ser corpo.
Ria a toa.
Isso tinha uma entonação particular.
Ele era do Nordeste, de Recife, e ria a toa.
Tinha duas tatuagens, uma em cada braço. Era voraz e afiado,
pau pequeno, mas afiado.
Num dia de desconhecidos quase não há contornos possíveis. Arranca o esmalte branco da sua unha.
Queda livre. Diz Manuel de Barros; há de se respeitar as oralidades.
Essas pausas de silêncio de cheiros e formas inomináveis.